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Lei dos Solos: Polémicas, Críticas e Perspectivas de Revogação

Alterações ao Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial

O Decreto-Lei n.º 117/2024, publicado em 30 de dezembro de 2024, introduz a sétima alteração ao Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial (RJIGT), originalmente aprovado pelo Decreto-Lei n.º 80/2015. Esta legislação permite a reclassificação simplificada de terrenos rústicos em urbanos, desde que destinados à habitação e aprovados pelos órgãos municipais. A proposta, defendida pelo Governo liderado por Luís Montenegro, visa facilitar o acesso a habitação a custos moderados e resolver a crise habitacional em Portugal. No entanto, a medida tem gerado amplo debate e críticas entre especialistas, organizações ambientais e partidos políticos.

Críticas e Reações da Sociedade Civil

Desde a sua promulgação pelo Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, o diploma tem sido alvo de contestação. Apesar de reconhecer os objetivos do Governo, o Presidente classificou a legislação como “um entorse significativo” no regime de ordenamento do território, tanto a nível nacional quanto local.

As organizações não-governamentais (ONG) ligadas à proteção ambiental manifestaram uma forte oposição. Entre os grupos que criticaram a medida destacam-se a Quercus, a Zero, a Liga para a Proteção da Natureza (LPN) e a Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA). Estas entidades argumentam que a construção em terrenos rústicos pode levar à destruição de ecossistemas, aumentar o risco de desastres ambientais e fomentar a especulação imobiliária.

Especialistas do Laboratório Associado Terra, que reúne investigadores das universidades de Lisboa e Coimbra, alertaram para os riscos de urbanização descontrolada, destacando a importância da sustentabilidade no uso dos recursos naturais. Paralelamente, a Ordem dos Arquitetos defendeu que a reclassificação de solos na Reserva Ecológica Nacional (REN) e na Reserva Agrícola Nacional (RAN) deve ser excecional e devidamente fundamentada, posição que não estaria assegurada pela nova legislação.

Apreciação Parlamentar e Divergências Políticas

A alteração ao RJIGT gerou também reações contundentes no plano político. O Bloco de Esquerda, o PCP, o Livre e o PAN solicitaram a apreciação parlamentar do decreto-lei, com o objetivo de revogar a medida. Esses partidos argumentam que a flexibilização para construção em solos rústicos poderá agravar a especulação imobiliária e comprometer a proteção ambiental. Em contraste, o PS manifestou abertura para alterar o diploma, mas não para sua revogação.

A apreciação parlamentar prevê a possibilidade de revogar o diploma ou propor alterações que serão discutidas em comissões antes de uma votação final. Se a revogação for aprovada, o diploma deixa de vigorar imediatamente após a publicação em Diário da República.

Impactos no Ordenamento do Território e na Habitação

O Governo defende que a nova legislação promoverá uma maior disponibilidade de terrenos para habitação, permitindo soluções habitacionais acessíveis. Contudo, as organizações de defesa ambiental e parte da comunidade acadêmica argumentam que a medida pode levar à fragmentação dos solos agrícolas e florestais, colocando em risco a segurança alimentar e a biodiversidade. A proposta de construção em áreas da REN e da RAN também foi criticada por contradizer compromissos internacionais assumidos por Portugal em matéria de proteção ambiental.

O diploma estabelece que a reclassificação de terrenos deve contribuir para a consolidação das áreas urbanas e proíbe construções em zonas de risco, como áreas propensas a inundações. Contudo, também prevê exceções que permitem construção em solos com aptidão moderada para uso agrícola ou sujeitos a riscos de erosão, o que tem gerado receios sobre a aplicação prática das restrições.

A lei dos solos representa um dos temas mais polêmicos no ordenamento do território em Portugal nos últimos anos. Enquanto o Governo defende que a medida é uma resposta à crise habitacional, a sociedade civil, a academia e organizações ambientais alertam para os riscos de fragmentação do território, especulação imobiliária e danos irreversíveis ao meio ambiente. O desfecho do debate no Parlamento determinará se o diploma será revogado, alterado ou mantido como está, influenciando decisivamente o futuro do ordenamento do território e da habitação em Portugal.

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